terça-feira, 31 de maio de 2011

A Outra

Desde o terceiro encontro, ela já lhe prometera amor eterno. E realmente acreditava que o amaria até o fim da sua vida, ou melhor, o amaria até mesmo em outras dimensões, fosse no céu, no inferno ou no purgatório. E ela sofria e derramava lágrimas todas as noites, quando lembrava que ele não estava ao seu lado naquele instante, ou em outras ocasiões tão banais, mas que para ela assumiam um formato importante, já que, desde a primeira vez em que se amaram, ela foi a outra. Justamente ela, que jamais se imaginou uma amante, a segunda opção, o escape de um homem, aquela que nunca teria o direito de ter o seu homem nos domingos e nas datas comemorativas.
E ela convivia com a certeza de que, se pudesse escolher amar outro homem, não escolheria, preferiria ficar com ele e só com ele, afinal, foi o destino que os cruzou e somente Deus os separaria. E agora ela já estava com quase trinta anos e em sua lista, cruzaram pouquíssimos namorados apresentados em casa, já causava a comoção de todos ao seu redor, que acreditavam que ela já havia ficado para titia, ou pior que isso, nem para titia havia ficado, já que sua zelosa mãe teve apenas uma filha. Mas a situação piora quando ela fora contratada para trabalhar na mesma empresa que ele, obrigando-os a conviverem um com o outro diariamente; para ela, foi a oportunidade que faltava em sua vida para amar e amar cada vez mais aquele homem, se é que isso fosse possível ainda; mas para ele, foi o crescimento desacertado de um problema, que tinha nome e sobrenome: Ela, a Outra, que agora estava ali, ao seu lado, os dois amantes tão pequeninos diante das peripécias do destino. E já haviam passado dez anos, sua mãe já se fora, levando consigo a mágoa de não ter visto a continuidade de sua geração, e ela manteve-se firme ao seu propósito de amor, tatuou ‘eu te amo’ em suas costas, e todos pensaram que a homenagem havia sido para a sua progenitora, e quando a questionavam, confirmava exatamente isso, que procurou eternizar o sentimento materno em sua pele. E aos quarenta anos, ela já perdera a esperança em ser mãe, de ser promovida na empresa, de casar de véu e de vestido branco; mas jamais perdera a esperança de deixar de ser a outra, logo ela, que foi a outra durante todo esse tempo, foi a outra nas madrugadas dentro do carro, no banheiro apertado da empresa, nos curtos intervalos do almoço. Sendo a outra, ela era mulher, em toda a plenitude desse significado. Seu amor era grande o bastante para aguardar o dia em que ele abandonaria a esposa, os filhos, a casa e enfim viveria inteiramente para ela. Não custava esperar mais um pouquinho.

Vinícius Dill Soares
Março de 2011

*Este conto inspirou uma poesia com o título O Outro.



2 comentários:

  1. Gostei deste texto, bem sentido.
    Sorte nessa sua nova empreitada.
    Abraço.
    @sara_escritora2

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  2. Ela amou tanto, mas que pena que nunca conseguiu amar a pessoa certa: ELA MESMA.
    Marie

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