sábado, 19 de novembro de 2011

Inverno

Primeira semana

Eu até tentei falar uma bobagem à toa, qualquer coisa que pudesse te fazer rir, como sempre acontecia entre a gente. E por mais que tenha sido engraçada a minha piada, aquele riso gostoso e frouxo não saiu. Ao contrário. Não escuto absolutamente nada e é esse inaudível barulho do silêncio que me irrita. E me entristece, profundamente. E as minhas mãos estão tão frias, tão geladas, assim como havia sido o nosso encontro de semana passada, aquele que, no fundo, sabia – seria inesquecível. Estou sim, ao teu lado, mas não mais posso te tocar, sentir o suave aroma do teu perfume, o teu toque que eriça meus pelos e despenteia meus cabelos. Então pra quê essa proximidade, meu Deus? Nem sei mais o que faço aqui, a minha visita serve apenas como uma forma de tortura. Autossofrimento. Desde a última semana, os dias passam como se fossem anos e é por causa dessa maluquice que eu também envelheço. É um desgaste físico e sentimental, que não levam apenas o frescor da minha juventude, mas também a minha imensa vontade de viver. Não dá mais pra ficar vivendo só de lembranças e incertezas, afinal, a única certeza que tenho é a de que um dia o sol descobre-se das nuvens. Lembro do vento cortante que cruzou meu caminho quando nos despedimos. É o mesmo vento que agora nos vela. Vela nossa história, sem presente e sem futuro. Vela, mais uma vez, a despedida. Tchau, semana que vem eu volto.

domingo, 13 de novembro de 2011

Claudia Tajes e eu

O relógio do celular marca 18h30min. Em meio à multidão que passa e repassa em minha frente, procuro apenas um rosto. Nas mãos, um suor frio. Na mochila, uns livros e um bolo que naquela altura provavelmente já virou patê. Faço de conta que escuto a conversa das gurias ao meu lado, mas nada prende minha atenção, a não ser aquelas caras andantes que nenhum pouco se parecem com a dela. Até que ela surge, inexplicavelmente, ao meu lado.
Nem tão impossível de explicar, é porque no desespero de avistá-la ao longe, esqueço de cuidar pelos lados.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sono interrompido

Não me peça equilíbrio às sete horas da manhã.
Os dias são cada vez mais agitados e as noites de sono cada vez mais curtas. Aqueles que podem dormir cedo são agraciados, conseguiram da rotina as suas liberdades condicionais. Deitar cedo. Por que levantar cedo é pré-requisito para uma vida em sociedade. Há os que juram gostar, há os que detestam, sobretudo nas segundas-feiras. Porém, a maioria não encontra escapatória. É encarar ou encarar.

domingo, 10 de julho de 2011

O Aquecedor

Comprara seu amor em dez vezes sem juros. Permanecera cansado por longas semanas. Esteve prestes a decretar desistência nisso que chamam de reciprocidade, sentimento mútuo, amor correspondido. O inverno havia chegado e mostrado todo o seu potencial congelante-destruidor. As manhãs eram frias e as noites alongadas. E a solidão o definhava, lenta e gradativamente. Juntou uma propaganda de loja da rua e mudou os planos do dia.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Seres que se Decepcionam

Decepção. A palavra soa bonito, é muito sonora, rima com coração, que é mais bonita ainda, rima com ilusão também. Com inquietação. Decepção é algo que a gente não gosta, mas espera. Decepção dói e tem seu lugarzinho devidamente registrado na agenda. É coisa que não se esquece. E nem se pode esquecer. Decepção faz da gente algo tão pequenino, tão propenso à tristeza e à fragilidade. E isso fica visível. A gente até tenta disfarçar a amargura de uma decepção, mas ela é humanamente aparente.

terça-feira, 31 de maio de 2011

A Outra

Desde o terceiro encontro, ela já lhe prometera amor eterno. E realmente acreditava que o amaria até o fim da sua vida, ou melhor, o amaria até mesmo em outras dimensões, fosse no céu, no inferno ou no purgatório. E ela sofria e derramava lágrimas todas as noites, quando lembrava que ele não estava ao seu lado naquele instante, ou em outras ocasiões tão banais, mas que para ela assumiam um formato importante, já que, desde a primeira vez em que se amaram, ela foi a outra. Justamente ela, que jamais se imaginou uma amante, a segunda opção, o escape de um homem, aquela que nunca teria o direito de ter o seu homem nos domingos e nas datas comemorativas.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

O Velhinho do Algodão-Doce Ainda Vive

Semana passada, em mais um dos muitos momentos ‘ônibus lotado’ que assolam minha vida, tive uma prazerosa surpresa ao me deparar com um velhinho sofrendo para subir e se assentar na lotação: olhei um tanto de canto, por cima dos óculos e o reconheci: era o mesmo vendedor de algodão-doce que morava bem pertinho da minha escola. Morava ou ainda mora. O seu nome eu não lembro, na verdade acho que nunca soube. Ele era apenas o tio do algodão-doce. Um detalhe importante é que ele não somente vendia a guloseima, mas também a fabricava.